December 3, 2024

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Entregadores de apps são 70% dos internados por trauma no HC

Entregadores de apps são 70% dos internados por trauma no HC

Hoje, de 60% a 70% das pessoas em estado mais grave que entraram ou ficaram internadas no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da USP trabalham com aplicativos de entrega. O dado está no relatório final da CPI dos Aplicativos da Câmara Municipal de São Paulo, apresentado nesta segunda-feira, dia 12.

A informação veio de Julia Maria D’Andréa Greve, professora da Faculdade de Medicina da USP e coordenadora técnica do Laboratório de Estudos do Movimento do Hospital das Clínicas, considerado o melhor hospital público do Brasil em 2021. Em reunião da Comissão de Saúde da Câmara Municipal em setembro de 2022, Greve afirmou que, em 2015 e 2016, acidentes de moto representavam apenas 20% dos atendimentos do Hospital das Clínicas.

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Trecho do depoimento de Julia Maria D’Andréa Greve na Comissão de Saúde da Câmara de São Paulo.

Hoje, o número chega a 80%, segundo ela. À comissão, Greve desabafou, segundo trecho apresentado no relatório: “Peço desculpas pelo discurso indignado, de quem está na linha de ponta vendo os incapacitados e o que isso acarreta às pessoas e famílias, mas estou [aqui] para dar o maior apoio a qualquer atividade, a qualquer ação que realmente traga soluções para isso”.

Além do número, que representa a maior parte dos atendimentos ortopédicos do hospital, Greve ressaltou o custo gerado aos cofres públicos decorrente do tratamento de motociclistas que se acidentaram trabalhando para as plataformas que não arcam com as demandas de saúde dos entregadores. “Um indivíduo com fratura exposta, se fizer o tratamento durante seis meses, por exemplo, representa um gasto de quase R$ 300 mil em procedimentos, remédios e cirurgias”, disse a professora.

Os dados estão no tópico “A lucratividade em detrimento da qualidade e segurança – os graves riscos que as operações dos aplicativos impõem ao cliente e aos trabalhadores”, na parte final do relatório. A comissão levantou dados de acidentes e mortes de motociclistas que fazem entregas por aplicativo no município e analisou a responsabilidade das empresas nos acidentes – seja incentivando o descuido dos entregadores com as leis de trânsito para faturar mais, promovendo promoções que obrigam muitas entregas em pouco tempo, seja deixando de arcar com gastos de saúde e cuidados necessários aos entregadores acidentados.

Apesar de oferecer um seguro para invalidez ou morte dos entregadores, receber os valores oferecidos não é fácil. O Intercept já mostrou as atribulações da família de um entregador morto em serviço e de outro baleado para conseguirem o benefício.

Os dados levantados pela CPI comprovam a dificuldade: apenas em 2021, 274 motociclistas morreram no trânsito de São Paulo, segundo a Companhia de Engenharia de Tráfego. Desses, 77 eram sabidamente motofretistas e tiveram sua profissão registrada pelo órgão. Em ofício, o iFood alegou que, entre março de 2020 e setembro de 2021, apenas 11 entregadores morreram em trabalho – a empresa só considera “trabalho” se o motociclista estiver no meio de uma rota de entrega, mas não enquanto espera os pedidos. O dado é referente ao número de indenizações pagas pela seguradora contratada pelo iFood.

O relatório da CPI crava que “são evidentes os indícios de que [os dados do iFood] não correspondem à realidade ou totalidade observada no cotidiano dos entregadores”.

O relatório final foi aprovado na última sessão da comissão instaurada na Câmara Municipal de São Paulo. O documento marca o fim da primeira investigação parlamentar sobre plataformas como Uber, 99 e iFood. As mais de 500 páginas apontam as descobertas dos parlamentares, suas análises sobre o uso das ruas da cidade, dos repasses em impostos feitos pelas empresas e das relações de trabalho e segurança dos trabalhadores promovidas por elas, além de uma série de encaminhamentos para órgãos públicos e outros poderes. Apenas 213 páginas estão disponíveis publicamente – as demais estão em um anexo de arquivos sigilosos que contêm informações sobre as empresas investigadas.